23.2.13

História (completa) do Martim


Introdução à história do Martim

Nasceu. Chama-se Martim, ainda não o é - para ser Martim espera-lhe barba e uma gravata, por enquanto ainda só se chama Martim e precisa de ser limpo daquele sangue de mãe que acabou de dar à luz, de parir - na forma mais grotesca de se dizer pois um parto não é visualmente bonito - tem gritos, tem sangue. Paradoxalmente é bonito ver-se uma vida a começar - só a começar - porque o Martim ainda não tem barba, nem uma gravata e ainda só sabe beber leite.

Desenvolvimento da história do Martim

Martim é agora demasiado crescido para beber leite - só bebe café ou bebidas espirituosas. Evita assim que se suje de branco a sua barba e a sua gravata que tão bem o representam em engates e em negócios. Fala francês, inglês e alemão. Mas fala sozinho. Apesar dos engates, a sua única companhia à noite são os cigarros que enrola e não precisa de lhes dizer nada. E assim é Martim de meia idade, um gajo que fuma cigarros como quem está só a pensar na vida que lhe passa - e que lhe passou - e na que se vai passar.

Conclusão da história do Martim

Martim deixou agora a barba e a gravata. Deixou também as línguas, já nem as precisa de usar - já nem as consegue dizer. As gravatas limitam-se também a ficar velhas, e a barba já nem nasce - ficou presa naquele corpo velho do velho Martim.
Que já nem velho é - já nem Martim é - já morreu.
Restou a sua velha pele de velho homem que já não é homem porque já não tem vida.

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